Rapper Ukah Veó se inspira em BK’, Djonga, Emicida, Baco e mais no álbum “O Sonho e a Dor”

Escrito por Fellipe Santos 03/06/2019 às 18:56

Foto: Divulgação

Ukah Veó exorciza demônios em seu primeiro disco solo.

Não é novidade que do fundo do poço saíram os trabalhos mais relevantes de muitos artistas. Períodos difíceis, marcados por perdas, frustrações ou recuperação, volta e meia levam compositores a criar músicas que servem tanto para encarar quanto para exorcizar demônios interiores. Ukah Veó entra para esse time com “O Sonho e a Dor”, seu primeiro disco solo marcado justamente pelo tom confessional.

Ukah é uma legenda do rap catarinense, no qual labuta há mais de duas décadas e convivendo com a elite e se inspirando em outros ícones como Racionais, Emicida, Marechal, Pentágono, Criolo, Bk’, Djonga, Filipe Ret, Flora Matos, RZO, Sombra SNJ, Pulse 011 e por aí afora. Em Joinville, fundou o grupo V.O., abriu a loja Brixton Hip Hop Raro e criou o Joinville Hip Hop Festival.

E foi justamente a edição de 2018 do evento, decepcionante em vários sentidos, o ponto de virada para Ukah. Ele, que já vinha rascunhando o novo trabalho há uns dois anos, caminhava na corda bamba de noitadas, curtição, bebidas, drogas e “tudo o que você possa imaginar de ruim que tem na noite”, diz ele. A corda arrebentou num divórcio e, mais tarde, no desastroso festival. O artista resolveu então que era hora de mudar.

Perdido, sem saber por onde recomeçar, o rapper se trancou em casa e começou a escrever feito louco e, nas palavras dele, descontou tudo na caneta.

“Eu não sei te dizer se era de fato uma depressão porque eu estava produzindo, e muito, mas teve músicas que escrevi chorando, literalmente assim como teve músicas que escrevi muito feliz. Sei lá, foi uma fase complicada”, diz Ukah, que sentiu todo o processo, até a ida para o estúdio, curando suas feridas.

Produzido por uma série de nomes, entre eles Cabes e Nansy Silvvz,ambos com trabalhos relevantes dentro do rap nacional, “O Sonho e a Dor” traz 12 faixas que deixam Ukah nu, metaforicamente falando. Nelas, o artista repassa a turbulência vivida recentemente, escancara tristeza e decepção, tece comentários sobre racismo, religião e outras questões.

O resultado, a despeito da sonoridade melodiosa e intimista, expõe uma raiva de lavar a alma. Veja “Nosso Reinado”, na qual Ukah se reconecta com suas raízes; “Precisamos Conversar” é sobre crise no relacionamento (que terminou em divórcio); a faixa-título fala de pessoas se metendo na sua vida; e “Carrossel” explana inveja, mentiras e preconceito.

Apesar dos temas universais, tudo aqui é conectado à vivência de Ukah e suas batalhas internas e externas. Como a que travou com o humorista e apresentador Danilo Gentili, uma treta pesada de dez anos atrás resgatada com o lyric video “Vai se Fude Gentili”, lançado em abril. Segundo o rapper, mexer de novo nesse vespeiro fez parte do processo do disco.

“O trampo do Gentili também me ajudou muito, era um trampo que, quando eu ensaiava, depositava muita energia nele, muita raiva, me jogava pra cima”, garante o rapper.

“O Sonho e a Dor” acaba de ser lançado. Ukah Veó percorreu a parte mais difícil do caminho de volta, que é aceitar as próprias feridas e tratá-las com sua arte. O segundo trecho lhe cabe menos: fazer o disco ressoar entre aqueles que também exibem cicatrizes e têm fardos para carregar. Escute o disco no topo.

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